E então notei que caminhava fazia tempo. Olhava a paisagem, tentava ver o final da estrada. Após a colina, que vinha depois do vale, não tinha muita certeza se era mesmo ali que acabava, mas ficava meio confusa com a vegetação e minha vista já não chegava a tanto. Ouvi alguma coisa chamando minha atenção. Não meu nome, a atenção. Lá estava desviada de novo para algo que a chamava como se chama a um amigo que, de tão íntimo, nem precisa de palavras. Olhei para a frente, não vi nada. Para os lados, também não. Olhei para trás. Havia uma pequena multidão. Estavam há alguns metros de mim e acenavam felizes e silenciosos. Não felizes por me distanciar, mas felizes como numa fotografia, moviam-se e, por mais que andasse, a distância continuava a mesma. Então resolvi ir até eles, mas quando me direcionei, eles se afastaram sem andar. Sempre alguns metros. Iguais à realidade, mas da forma como me lembro. No colo de uma das minhas avós, um dos meus ursos de pelúcia que dava para lavar na máquina de lavar. Minha outra avó, sentada de pijama branco e havaianas, balançava os pezinhos e se apoiava nos punhos, feliz. E tinha um menino pequeno com uma fantasia engraçada e bem sorridente, e meus irmãos e minha irmã e meus pais e esse núcleo familiar era vários, de diferentes idades, tamanhos, ânimos. E os meus amigos também – alguns eram tão pequenos e, logo ao lado, um outro deles, maior. E tinha aqueles que nem sei quem são ou o que faziam lá. Tinha a mulher que amo que, junto com minha mãe, parecia ter convidado a todos, e elas eram tantas e estavam em todos os lugares. Meu pai carregava um menino no colo, e esse menino olhava seu nariz e brincava com um boneco de fantoche e ria com meu pai, que também tinha uma versão de terno e uma de roupas divertidas e um pano de pratos no ombro fazendo algo bom para comer. Meus irmãos animavam o povo todo e sabiam tantas coisas e eram muito simpáticos com todos e não poderiam não ser, e minha irmã, quietinha, morria de rir de tudo isso – eram várias dela, e elas riam e sorriam e faziam muitos “jóinhas” com a mão. Meus amigos pareciam um para-choque – ficavam fixos, firmes, não se movimentavam para os lados, mas estavam ali iguais a quando a gente olha para a lâmpada e fecha os olhos depois. Num canto tinha uma sacola com um monte de truques de mágica feitos de plástico e tinha nhoque num restaurante no centro da cidade e tinha um menino fazendo umas besteiras graves – todos acenando e dizendo da forma deles que aquilo era um sorriso e tinha coisas que simplesmente eram um sorriso. Um soluço pulou de mim. Fiquei na dúvida se era um soluço que introduzia lágrima ou risada. E fiquei sem saber. Olhei para a frente e continuei andando e continuo sempre. E a alguns metros de mim também continuam sempre.